Significado de Messias
A figura do Messias (do hebraico Mašíaḥ, מָשִׁיחַ) é central para a fé judaica e, de forma ainda mais proeminente, para a fé cristã. Este termo designa o "Ungido" de Deus, uma figura divinamente escolhida e capacitada para cumprir um propósito redentor e soberano na história da salvação. A compreensão do Messias é fundamental para a teologia protestante evangélica, que reconhece Jesus de Nazaré como o cumprimento definitivo de todas as profecias e expectativas messiânicas do Antigo Testamento.
A análise desta figura transcende a mera biografia, pois o Messias não é apenas um personagem, mas um conceito teológico que se desenvolve progressivamente ao longo das Escrituras, culminando na pessoa e obra de Jesus Cristo. Sua relevância abrange a história da redenção, a natureza de Deus, a condição humana e o destino final da criação. Para os cristãos evangélicos, o Messias é o coração do evangelho, a ponte entre o Antigo e o Novo Testamento, e o fundamento da esperança eterna.
Este estudo aprofundará o significado onomástico, o contexto histórico, o caráter multifacetado, a profunda relevância teológica e o legado duradouro do Messias, conforme revelado na Palavra de Deus. A perspectiva adotada será a da teologia reformada e evangélica conservadora, que sustenta a autoridade inerrante da Bíblia e a centralidade de Cristo em toda a Escritura.
1. Etimologia e significado do nome
O termo Messias deriva do hebraico Mašíaḥ (מָשִׁיחַ), que literalmente significa "ungido". A raiz verbal māšaḥ (מָשַׁח) significa "ungir" ou "esfregar com óleo". Este ato de unção com óleo era uma cerimônia sagrada que conferia autoridade e consagração para um ofício específico, simbolizando a separação e capacitação divina para uma tarefa especial. O óleo representava a presença e o poder do Espírito de Deus.
No Antigo Testamento, a unção era aplicada a diferentes indivíduos investidos de autoridade divina. Reis, como Saul (1 Samuel 10:1) e Davi (1 Samuel 16:13), eram ungidos para seu ofício régio, sendo por isso chamados de "ungidos do Senhor". Sacerdotes, como Arão e seus filhos, eram ungidos para o serviço sacerdotal (Êxodo 29:7, 30:30), e profetas ocasionalmente também recebiam unção, como Elias ungiu Eliseu (1 Reis 19:16). Até mesmo Ciro, o rei persa, é referido como o "ungido" de Javé em Isaías 45:1, indicando que Deus o usou para Seus propósitos.
No entanto, ao longo do tempo, o termo Mašíaḥ começou a adquirir um significado mais específico e escatológico. Ele passou a se referir a um libertador futuro, um rei ideal da linhagem de Davi, que estabeleceria o reino eterno de Deus e traria salvação e justiça. Essa expectativa se intensificou em períodos de opressão e exílio, quando o povo de Israel ansiava por um líder que restaurasse a glória de Israel e cumprisse as promessas divinas.
No Novo Testamento, o termo grego equivalente a Mašíaḥ é Christos (Χριστός), que também significa "ungido". Os escritores do Novo Testamento consistentemente aplicam Christos a Jesus de Nazaré, afirmando que Ele é o cumprimento do Messias prometido. Assim, "Jesus Cristo" significa "Jesus, o Messias" ou "Jesus, o Ungido". Esta transição do hebraico para o grego é crucial, pois universalizou o conceito do Messias para além das fronteiras judaicas.
A significância teológica do nome reside na ideia de um agente divinamente escolhido e capacitado. O Messias não é um líder autoproclamado, mas alguém investido da autoridade e do Espírito de Deus. Isso sublinha a soberania divina na escolha e no envio do Redentor, e a natureza sagrada e transcendente de Sua missão. A unção simboliza a consagração para os ofícios de Profeta, Sacerdote e Rei, que o Messias, Jesus Cristo, cumpre perfeitamente.
2. Contexto histórico e narrativa bíblica
A expectativa do Messias se desenvolve através de um vasto panorama histórico e teológico, começando nas primeiras promessas divinas e se estendendo até o advento de Jesus Cristo. O conceito de um ungido de Deus surge em contextos variados, desde a teocracia inicial de Israel até os períodos de monarquia, exílio e dominação estrangeira, moldando as esperanças do povo judeu por um libertador.
A semente da promessa messiânica pode ser rastreada até Gênesis 3:15, o protoevangelho, onde Deus promete que o descendente da mulher feriria a cabeça da serpente. Esta promessa é reiterada a Abraão, de que através de sua descendência todas as famílias da terra seriam abençoadas (Gênesis 12:3). Mais tarde, Jacó profetiza que o cetro não se apartaria de Judá, nem o bastão de comando de entre seus pés, até que viesse aquele a quem ele pertence (Gênesis 49:10), apontando para um líder régio.
O pacto Davídico em 2 Samuel 7:12-16 é um marco central. Deus promete a Davi que um de seus descendentes estabeleceria um reino eterno, e que seu trono seria firme para sempre. Esta promessa solidificou a expectativa de que o Messias seria um rei da linhagem de Davi. Profetas subsequentes, como Isaías, Miqueias e Jeremias, expandiram essa visão, detalhando aspectos da natureza e missão do Messias.
Isaías, em particular, apresenta uma rica tapeçaria de profecias messiânicas, descrevendo-o como Emanuel (Deus conosco, Isaías 7:14), um rei justo sobre o trono de Davi (Isaías 9:6-7), um broto do tronco de Jessé (Isaías 11:1-10), e, surpreendentemente, um Servo Sofredor que carregaria os pecados de muitos e seria esmagado por suas iniquidades (Isaías 53). Miqueias profetiza seu nascimento em Belém de Judá (Miqueias 5:2), enquanto Daniel prediz o tempo de sua vinda e seu sacrifício expiatório (Daniel 9:24-27).
O contexto político e social do período intertestamentário e do Novo Testamento era de dominação romana, com o povo judeu ansiando por um libertador que os livrasse da opressão estrangeira. Havia diversas expectativas messiânicas, muitas delas focadas em um líder político-militar que restauraria a soberania de Israel. João Batista surge preparando o caminho, anunciando a chegada do Messias (Mateus 3:1-3).
A narrativa bíblica culmina com Jesus de Nazaré, cujo nascimento em Belém (Lucas 2:4-7), criação em Nazaré (Mateus 2:23), ministério na Galileia e Judá (Marcos 1:14-15), morte sacrificial em Jerusalém (Mateus 27:32-50) e ressurreição (João 20:1-10) são apresentados nos Evangelhos como o cumprimento das Escrituras messiânicas. Ele se relaciona com figuras como João Batista, Seus discípulos, e os líderes religiosos da época, que frequentemente falhavam em reconhecê-Lo como o Messias devido às suas expectativas terrenas e pré-concebidas.
3. Caráter e papel na narrativa bíblica
O caráter do Messias, conforme revelado nas Escrituras, é multifacetado e transcende qualquer figura humana. No Antigo Testamento, as profecias delineiam um rei justo, sábio, poderoso e compassivo, que governaria com equidade e traria paz duradoura. A figura do Servo Sofredor em Isaías 53 adiciona a dimensão de humildade, sacrifício e redenção através do sofrimento.
Em Jesus Cristo, o Messias, todas essas características se manifestam em perfeição. Ele é retratado como alguém sem pecado (Hebreus 4:15), que exemplifica a santidade, a justiça e a fidelidade de Deus. Suas virtudes incluem um amor incondicional (João 15:13), compaixão pelos oprimidos e marginalizados (Mateus 9:36), humildade ao assumir a forma de servo (Filipenses 2:6-8), e uma obediência inquestionável à vontade do Pai (João 5:30).
O Messias desempenha um papel triplo fundamental na narrativa bíblica, cumprindo os ofícios de Profeta, Sacerdote e Rei. Como Profeta, Ele revela a verdade de Deus com autoridade inquestionável, ensinando sobre o Reino de Deus e a vontade divina (João 1:18, 14:6). Ele é o Profeta prometido por Moisés em Deuteronômio 18:15.
Como Sacerdote, o Messias oferece a si mesmo como o sacrifício perfeito e definitivo pelos pecados da humanidade, pondo fim à necessidade de sacrifícios repetitivos do Antigo Testamento (Hebreus 7:27, 9:12). Ele é o Sumo Sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque (Salmo 110:4, Hebreus 7), que intercede continuamente por Seu povo junto a Deus Pai.
Como Rei, o Messias estabelece um reino espiritual e eterno, que não é deste mundo (João 18:36), mas que eventualmente se manifestará em plenitude. Ele governa com justiça e retidão, e Seu domínio se estende sobre toda a criação (Isaías 9:6-7, Lucas 1:32-33). Suas ações significativas incluem curas milagrosas, expulsão de demônios, ensino profundo, ressurreição de mortos, e, centralmente, Sua morte e ressurreição, que são a base da redenção.
O desenvolvimento do conceito do Messias na narrativa bíblica mostra uma progressão da expectativa inicial de um rei terreno para a revelação de um Salvador sofredor e ressurreto. A falha de muitos em reconhecer Jesus como o Messias deveu-se, em grande parte, à sua incapacidade de reconciliar as profecias do Messias glorioso com as profecias do Messias sofredor, vendo apenas o aspecto régio e político e não o redentor e sacrificial.
4. Significado teológico e tipologia
O significado teológico do Messias é o cerne da teologia bíblica e sistemática, especialmente sob a perspectiva protestante evangélica. Ele é o ponto focal da história redentora de Deus, o agente divinamente designado para restaurar a comunhão entre Deus e a humanidade, rompida pelo pecado. Toda a revelação progressiva das Escrituras aponta para Ele.
A Bíblia apresenta inúmeras prefigurações e tipos do Messias ao longo do Antigo Testamento. Adão, como cabeça da humanidade, prefigura Cristo como o segundo Adão, o cabeça de uma nova criação (Romanos 5:12-21). Abel, com seu sacrifício aceitável, e Noé, como construtor da arca que salvou sua família do juízo, também apontam para aspectos da obra do Messias. Abraão, o pai da fé, recebe a promessa de que todas as nações seriam abençoadas em sua descendência, promessa cumprida em Cristo (Gálatas 3:16).
Moisés, como libertador do Egito, legislador, profeta e mediador da Antiga Aliança, é um tipo poderoso do Messias, que liberta Seu povo da escravidão do pecado e estabelece uma Nova Aliança (Deuteronômio 18:15-19; Hebreus 8:6-13). Davi, o rei ideal de Israel, estabelece o modelo do reino messiânico, e a aliança davídica garante que o Messias viria de sua linhagem para governar um reino eterno (2 Samuel 7:12-16).
Os sacerdotes do Antigo Testamento, com seus sacrifícios e intercessão, prefiguram o Messias como o Sumo Sacerdote perfeito que oferece a si mesmo como sacrifício único e suficiente (Hebreus 7-10). Os profetas, que falavam a palavra de Deus, antecipam o Messias como a Palavra encarnada, a revelação final e completa de Deus (João 1:1, 14; Hebreus 1:1-3).
O Novo Testamento é a narrativa do cumprimento destas profecias e tipos em Jesus Cristo. Cada evangelista apresenta Jesus como o Messias, cumprindo as expectativas judaicas e revelando a plenitude do plano de salvação de Deus. Por exemplo, Mateus 1:22-23 cita Isaías 7:14 para mostrar que o nascimento de Jesus de uma virgem cumpre a profecia do Emanuel.
A vinda do Messias está intrinsecamente ligada a temas teológicos centrais: a salvação pela graça mediante a fé (Efésios 2:8-9), a expiação vicária pelos pecados (Romanos 3:25), a justificação pela fé (Romanos 5:1), a santificação pelo Espírito (1 Pedro 1:2), e o estabelecimento do Reino de Deus. Ele é o centro da soberania divina, da justiça e do amor de Deus, e a única esperança para a humanidade caída.
5. Legado bíblico-teológico e referências canônicas
O legado do Messias é imensurável, permeando cada livro do cânon bíblico e moldando profundamente a teologia judaica e cristã. Desde as primeiras promessas em Gênesis até a visão escatológica em Apocalipse, o Messias é a figura unificadora e o tema central de toda a Escritura. Ele é a chave hermenêutica para compreender o propósito de Deus na criação e na redenção.
No Antigo Testamento, o conceito do Messias se desenvolve através de narrativas históricas, leis, salmos e profecias. O Messias é o sujeito dos Salmos régios (ex: Salmo 2, 110), o cumprimento das promessas abraâmicas e davídicas, e a esperança dos profetas para a restauração de Israel e das nações. Ele é o ponto culminante da história de Israel, o destino para o qual toda a história sagrada se move.
No Novo Testamento, Jesus Cristo é inequivocamente identificado como o Messias. Os Evangelhos narram Sua vida, morte e ressurreição como o cumprimento das profecias messiânicas. As epístolas apostólicas, como as de Paulo e Pedro, desenvolvem a cristologia, explicando a identidade divina e humana do Messias, Sua obra expiatória e Sua soberania como Senhor. O livro de Apocalipse retrata o Messias glorificado, que retornará para julgar e reinar eternamente (Apocalipse 1:7, 22:20).
Na tradição interpretativa judaica, o Messias é esperado como um rei terreno que restaurará Israel, reconstruirá o Templo e trará uma era de paz e justiça universal. A maioria dos judeus não reconheceu Jesus como o Messias devido às expectativas de um líder político e à dificuldade em conciliar as profecias do Servo Sofredor com as do Rei Glorioso. No entanto, a literatura intertestamentária, como os Salmos de Salomão e alguns textos de Qumran, revela uma diversidade de expectativas messiânicas, algumas das quais incluíam um Messias sacerdotal ou sofredor.
A teologia reformada e evangélica enfatiza a centralidade de Jesus Cristo como o Messias prometido e o Senhor soberano. Ela sustenta que todas as Escrituras apontam para Ele (Lucas 24:27, 44) e que a salvação é encontrada somente n'Ele (Atos 4:12). A doutrina da expiação vicária de Cristo, Sua ressurreição corporal e Sua ascensão e reinado à direita do Pai são pilares da fé evangélica, fundamentados na identidade de Jesus como o Messias.
A importância do Messias para a compreensão do cânon é que Ele provê a unidade e a coerência de toda a Bíblia. Ele é o fio de ouro que conecta as promessas do Antigo Testamento com o seu cumprimento no Novo Testamento. Sem a figura do Messias, o plano redentor de Deus seria fragmentado e incompreensível, e a esperança da humanidade, vazia. Ele é o Alfa e o Ômega (Apocalipse 1:8), o princípio e o fim de toda a história da salvação.