GoBíblia - Ler a Bíblia Online em múltiplas versões!

Significado de Saliva

1. Etimologia e raízes da Saliva no Antigo Testamento

A análise teológica do termo bíblico Saliva exige um exame cuidadoso de suas ocorrências e conotações nas Escrituras, reconhecendo que, diferentemente de conceitos como graça ou , a Saliva não é um termo teológico em si, mas um elemento físico cujo uso e menção carregam significados contextuais profundos. No Antigo Testamento, não há uma palavra hebraica única que se traduza diretamente como "Saliva" com um significado teológico intrínseco. Em vez disso, encontramos termos relacionados ao ato de cuspir ou à substância em si, geralmente em contextos que denotam desprezo, humilhação ou condição física.

As principais palavras hebraicas a serem consideradas são yaraq (ירק), que significa "cuspir", e roq (רוק), que se refere à "saliva" ou "cuspe". A ocorrência mais proeminente de yaraq em um contexto de desprezo é encontrada em Números 12:14, onde Deus descreve a vergonha de Miriam ao ser afligida com lepra, comparando-a a um pai que cuspiria no rosto de sua filha. Este ato de cuspir no rosto era um símbolo universal de desonra e humilhação profunda, indicando não apenas repulsa, mas também um julgamento público da dignidade da pessoa.

Outro exemplo significativo do ato de cuspir como sinal de desprezo e condenação social aparece na lei do levirato em Deuteronômio 25:9. Se um homem se recusasse a cumprir seu dever de casar-se com a viúva de seu irmão para suscitar descendência, a mulher deveria cuspir no seu rosto na presença dos anciãos. Este ritual público não era apenas um sinal de desaprovação, mas uma marca indelével de desonra que o identificaria como alguém que não cumpriu sua obrigação para com a família e a comunidade, demonstrando a seriedade das leis sociais e familiares em Israel.

O termo roq, referindo-se à substância física da Saliva, aparece notavelmente em 1 Samuel 21:13 (na Septuaginta, 1 Samuel 21:14 na numeração hebraica), na narrativa em que Davi finge loucura diante de Aquis, rei de Gate. A passagem descreve Davi "deixando escorrer a sua Saliva pela barba". Neste contexto, a Saliva é apresentada como um sinal de doença mental ou descontrole, um indicativo de uma condição humana degradada ou anormal. Não há aqui qualquer conotação de poder ou santidade, mas sim de vulnerabilidade e fragilidade humana, usada por Davi como um estratagema para preservar sua vida.

A compreensão hebraica da Saliva, portanto, está enraizada em sua manifestação física e social. Ela era associada à impureza ritual em certos contextos (embora não explicitamente legislada como tal) e, mais frequentemente, como um meio de expressar desprezo, vergonha ou uma condição de deficiência. Não há indícios de que a Saliva possuísse qualquer poder curativo ou místico no Antigo Testamento; pelo contrário, sua menção é quase sempre em um contexto negativo ou de baixa estima. Isso estabelece um pano de fundo crucial para a revelação progressiva, pois o uso da Saliva por Jesus no Novo Testamento representará uma reinterpretação radical e uma subversão dessas conotações negativas, transformando um símbolo de desprezo em um instrumento de graça e poder divino.

A teologia reformada, com sua ênfase na soberania de Deus sobre toda a criação, reconhece que mesmo os elementos mais comuns e, por vezes, desprezados, podem ser usados por Ele para Seus propósitos. No Antigo Testamento, a Saliva é parte da criação, sujeita à queda e às suas consequências, manifestando-se em contextos de vergonha e fraqueza. Essa perspectiva de um elemento mundano, frequentemente associado à degradação, prepara o terreno para a gloriosa revelação de como Cristo redimiria e santificaria até mesmo os aspectos mais humildes da existência.

2. Saliva no Novo Testamento e seu significado

A transição para o Novo Testamento revela uma mudança dramática na percepção e no uso da Saliva, especialmente em relação à pessoa e obra de Jesus Cristo. Enquanto no Antigo Testamento a Saliva era predominantemente associada ao desprezo e à degradação, nos Evangelhos ela se torna, nas mãos de Jesus, um instrumento de cura e um símbolo da manifestação do poder divino. As palavras gregas correspondentes são ptyo (πτύω) para "cuspir" e ptysma (πτύσμα) para "cuspe" ou "Saliva".

O significado literal da Saliva permanece o mesmo – uma secreção corporal. Contudo, seu significado teológico é transformado pelo contexto da encarnação de Cristo e Seus milagres. Jesus usa a Saliva em três ocasiões notáveis para realizar curas: no surdo-mudo de Decápolis (Marcos 7:31-37), no cego de Betsaida (Marcos 8:22-26) e no cego de nascença em Jerusalém (João 9:1-7). Em cada um desses casos, o uso da Saliva por Jesus é um ato deliberado e intencional, carregado de significado teológico profundo, apesar de sua aparente simplicidade.

Em Marcos 7:33, Jesus leva o surdo-mudo à parte, coloca os dedos nos ouvidos dele e, "tendo cuspido, tocou-lhe a língua". Este ato íntimo e tátil demonstra a compaixão de Cristo e Sua disposição em se envolver fisicamente com a aflição humana. O toque da Saliva, em vez de contaminar, santifica e cura, invertendo as conotações de impureza que a Saliva poderia ter em outros contextos judaicos. Aqui, a Saliva de Jesus não é um contaminante, mas um veículo do poder restaurador do Criador.

De forma semelhante, em Marcos 8:23, Jesus leva o cego para fora da aldeia e "cuspiu-lhe nos olhos". Após o primeiro toque e a pergunta sobre o que ele via, e um segundo toque, a visão do homem é restaurada. O uso da Saliva, combinado com o toque de Jesus, sugere uma conexão pessoal e direta com o enfermo, um agir que transcende a mera palavra e se manifesta através de um elemento físico comum. É uma demonstração tangível de que o poder de Deus não está restrito a métodos convencionais, mas pode operar através de qualquer meio que Ele escolha.

O relato mais detalhado e teologicamente rico do uso da Saliva por Jesus é encontrado em João 9:6, na cura do cego de nascença. Jesus "cuspiu na terra e, tendo feito lodo com a Saliva, ungiu com o lodo os olhos do cego". Este ato evoca a narrativa da criação em Gênesis 2:7, onde Deus forma o homem do pó da terra. A mistura da Saliva de Cristo com o pó da terra simboliza a obra da Nova Criação, onde Jesus, o Novo Adão, usa os elementos da criação para restaurar e recriar. A Saliva de Jesus, aqui, não é apenas um catalisador, mas um componente da manifestação da Sua divindade e do Seu poder criador.

A relação específica da Saliva com a pessoa e obra de Cristo é multifacetada. Primeiro, ela sublinha a plena humanidade de Jesus. Como Deus encarnado, Ele possuía um corpo humano com todas as suas funções naturais, incluindo a produção de Saliva. O fato de Ele usar um elemento tão terreno e comum ressalta Sua identificação com a humanidade em sua condição mais básica, ao mesmo tempo em que demonstra Sua soberania sobre a criação. Segundo, o uso da Saliva por Jesus é um ato de graça soberana. Ele poderia ter curado com uma palavra, como fez em muitas outras ocasiões (cf. Mateus 8:8). A escolha de usar a Saliva, um meio aparentemente humilde, destaca que a cura não dependia de um ritual mágico, mas da vontade e do poder de Deus manifestados em Cristo.

Há uma clara continuidade e, ao mesmo tempo, uma descontinuidade entre o Antigo e o Novo Testamento em relação à Saliva. A continuidade reside no fato de que a Saliva permanece um elemento físico da criação. A descontinuidade é radical: enquanto no AT era associada a desprezo e humilhação (cf. Números 12:14; Deuteronômio 25:9), nas mãos de Cristo, ela é redimida e empregada como um instrumento de bênção e restauração. Essa transformação é um testemunho da obra redentora de Cristo, que não apenas salva a humanidade, mas também redime e santifica a própria criação.

É crucial notar a ironia nos Evangelhos onde Jesus é, ele próprio, alvo de cuspes. Em Mateus 26:67, Marcos 14:65 e Marcos 15:19, os guardas e a multidão cospem em Jesus durante Seu julgamento e crucificação. Aqui, a Saliva retorna à sua conotação de desprezo e humilhação, mas agora direcionada ao próprio Filho de Deus. Este contraste é profundo: o mesmo elemento que Jesus usou para trazer cura e dignidade aos marginalizados é usado para infligir a máxima desonra sobre Ele. Isso serve para destacar a profundidade da depravação humana e a extensão do sacrifício de Cristo, que suportou a vergonha e o desprezo para nos redimir.

3. Saliva na teologia paulina: a base da salvação

A teologia paulina, com sua profunda sistematização da doutrina da salvação, não faz menção explícita à Saliva. No entanto, os princípios teológicos subjacentes aos atos de cura de Jesus que envolveram Saliva ressoam fortemente com as verdades centrais articuladas por Paulo, especialmente a sola gratia (somente pela graça) e sola fide (somente pela fé). Embora a Saliva não seja um conceito teológico em si para Paulo, o modus operandi de Jesus ao usá-la ilustra perfeitamente a natureza da salvação que o apóstolo tanto defende.

A base da salvação, conforme Paulo ensina em cartas como Romanos, Gálatas e Efésios, é a graça soberana de Deus, não as obras ou o mérito humano. Em Efésios 2:8-9, Paulo declara: "Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie." As curas de Jesus que envolveram Saliva são paradigmas dessa graça. Os cegos e surdos-mudos não fizeram nada para merecer a cura; ela foi um dom imerecido, uma manifestação da compaixão e do poder de Cristo. O uso de Saliva, um elemento comum e até desprezível, enfatiza que o poder não reside no meio, mas no Agente divino que o emprega.

O contraste com as obras da Lei e o mérito humano é evidente. Ninguém poderia "ganhar" uma cura de Jesus através de rituais ou esforços. Assim como a justificação (ser declarado justo diante de Deus) não é por obras da Lei, mas pela fé em Cristo (Romanos 3:28), a cura física por Jesus era um ato de favor divino. A Saliva, longe de ser um elemento mágico que por si só conferiria poder, era um instrumento escolhido por Jesus para demonstrar que a origem da cura era puramente Sua autoridade e graça, e não qualquer rito humano ou mérito do enfermo.

A relação entre os atos de cura de Jesus e a doutrina da salvação (ordo salutis) pode ser vista em várias fases. A cura física é um sinal tangível da redenção espiritual que Cristo veio trazer. A restauração da vista ao cego ou da audição ao surdo-mudo é uma metáfora poderosa para a iluminação espiritual e a capacidade de ouvir a voz de Deus, que são componentes da regeneração e da conversão. Em 2 Coríntios 5:17, Paulo afirma: "Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é: as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo." As curas de Jesus eram um prenúncio e uma demonstração dessa nova criação.

A justificação, o ato de Deus declarar pecadores justos com base na obra de Cristo, é a porta de entrada para a salvação. Os que foram curados por Jesus, foram instantaneamente restaurados, declarados "inteiros" por seu toque ou palavra. Essa restauração é análoga à justificação, onde o crente é declarado justo não por mérito próprio, mas pela justiça imputada de Cristo. A Saliva, como meio, aponta para a simplicidade e a soberania do método divino, que não depende de elaboradas cerimônias, mas da ação direta de Cristo.

A santificação, o processo de ser conformado à imagem de Cristo, é o desdobramento da graça na vida do crente. As curas de Jesus, que restauraram a dignidade e a funcionalidade aos enfermos, são um tipo de santificação física, um retorno à plenitude da criação. Assim como o corpo foi restaurado, o espírito e a alma do crente são progressivamente santificados pelo Espírito Santo (Romanos 12:1-2). O uso da Saliva por Jesus, um elemento da própria carne que Ele redimiu, pode ser visto como um símbolo de como Deus usa e transforma o que é terreno para Seus propósitos celestiais.

Finalmente, a glorificação, a consumação da salvação na ressurreição do corpo e na vida eterna, é o ápice da obra redentora de Cristo. As curas milagrosas de Jesus, incluindo aquelas que envolveram Saliva, são antecipações da glorificação final, quando todo sofrimento será removido e a criação será totalmente restaurada. O corpo que foi curado pela Saliva de Jesus é um vislumbre do corpo glorificado que os crentes receberão. Teólogos reformados como João Calvino enfatizaram a importância de ver a obra de Cristo como um todo coerente, onde cada ação, por mais simples que pareça, aponta para a grandiosa obra de redenção.

Em suma, embora a Saliva não seja uma doutrina paulina, os atos de Jesus que a envolveram são ilustrações vívidas dos princípios da graça, soberania divina e nova criação que formam a espinha dorsal da teologia da salvação de Paulo. Eles demonstram que Deus opera de maneiras que muitas vezes desafiam as expectativas humanas, usando o que é humilde e comum para manifestar Seu poder e Sua glória, um tema recorrente na teologia paulina (cf. 1 Coríntios 1:27-29).

4. Aspectos e tipos de Saliva

Aprofundar a análise da Saliva biblicamente nos leva a considerar diferentes facetas e distinções teológicas que, embora não formalizadas como "tipos de Saliva", emergem do seu contexto e uso nas Escrituras. Essas distinções ajudam a compreender como um elemento tão comum pode ser investido de significado teológico sob a perspectiva da soberania divina e da obra de Cristo. Podemos categorizar as manifestações da Saliva em pelo menos três aspectos principais: a Saliva como elemento natural da criação, a Saliva como símbolo de desprezo na condição caída, e a Saliva como instrumento de poder e graça nas mãos de Cristo.

O primeiro aspecto é a Saliva como um elemento da criação. Ela faz parte da fisiologia humana e animal, um produto natural do corpo. Nesse sentido, a Saliva está sob a égide da graça comum de Deus, que sustenta toda a criação e permite seu funcionamento. Como todas as coisas criadas, a Saliva é intrinsecamente boa (Gênesis 1:31), embora sujeita aos efeitos da Queda. Não possui poder inerente, mas é um testemunho da complexidade e inteligência do design divino no corpo humano.

O segundo aspecto é a Saliva como símbolo de desprezo e humilhação na condição caída. Conforme visto no Antigo Testamento (Números 12:14; Deuteronômio 25:9; 1 Samuel 21:13) e no Novo Testamento (Mateus 26:67; Marcos 14:65; Marcos 15:19), o ato de cuspir é um gesto de profundo desdém e degradação. Este uso da Saliva reflete a pecaminosidade humana e a capacidade do homem de infligir vergonha e sofrimento. É a Saliva em seu estado "não redimido", usada para propósitos malignos ou para expressar a condição decaída da humanidade.

O terceiro e mais teologicamente significativo aspecto é a Saliva como instrumento de poder e graça nas mãos de Cristo. Nas curas de Jesus (Marcos 7:33; Marcos 8:23; João 9:6), a Saliva é investida de um propósito divino. Este não é um poder inerente à Saliva em si, mas um poder que flui da pessoa de Cristo. É um ato de graça especial, uma manifestação milagrosa que transcende a ordem natural. A Saliva, nesse contexto, torna-se um sinal visível do poder invisível de Deus, uma extensão física do toque do Salvador.

A relação com outros conceitos doutrinários correlatos é evidente. O uso da Saliva por Jesus sublinha a doutrina da Encarnação, enfatizando a plena humanidade de Cristo que, ao mesmo tempo, é plenamente Deus. Ele não evita o contato com a matéria, mas a usa como um canal de Sua glória. Além disso, a Saliva misturada com barro na cura do cego de nascença (João 9:6) aponta para a doutrina da Nova Criação. Assim como Deus formou Adão do pó da terra, Jesus, o Novo Adão, usa a terra e Sua própria Saliva para recriar, simbolizando a restauração de toda a criação através d'Ele.

Na história da teologia reformada, a ênfase sempre esteve na soberania de Deus e nos meios que Ele escolhe para operar. Teólogos como Jonathan Edwards, ao discutir a obra de Deus na natureza e na redenção, poderiam ver o uso da Saliva por Cristo como um exemplo da sabedoria divina que usa "coisas fracas e desprezíveis" para manifestar Seu poder, conforme 1 Coríntios 1:27-29. Não é a Saliva que cura, mas Cristo que cura, e a Saliva é apenas um dos muitos meios que Ele soberanamente escolhe.

É fundamental evitar erros doutrinários ao considerar a Saliva. Primeiro, o erro do magicismo, que atribuiria poder intrínseco à Saliva ou a qualquer outro elemento físico. A teologia reformada rejeita qualquer forma de superstição ou ritualismo que desvie a glória de Cristo. Segundo, o erro do gnosticismo ou docetismo, que desvalorizaria a matéria ou a humanidade de Cristo. O uso da Saliva por Jesus reafirma a bondade da criação e a realidade de Sua encarnação. Terceiro, o erro de tentar replicar os métodos de Jesus sem Sua autoridade e poder. Os atos de Jesus com a Saliva eram únicos à Sua pessoa e missão, não um modelo para uma prática geral de cura na igreja. O Dr. Martyn Lloyd-Jones, em suas pregações sobre os Evangelhos, frequentemente enfatizava que a singularidade dos milagres de Cristo residia em Sua divindade, e não em meras técnicas replicáveis.

Em resumo, a Saliva, em suas diferentes manifestações bíblicas, serve como um microcosmo da tensão entre a criação e a queda, e da glória da redenção em Cristo. Ela nos lembra que Deus pode usar os elementos mais comuns e até mesmo os mais desprezados para manifestar Sua graça e poder soberanos, transformando o que é terreno em um testemunho do celestial.

5. Saliva e a vida prática do crente

Embora a Saliva não seja um tópico de sermão comum, a análise teológica de suas ocorrências e uso por Jesus Cristo oferece profundas implicações para a vida prática do crente, moldando nossa piedade, adoração e serviço. A perspectiva protestante evangélica conservadora enfatiza que toda a Escritura é proveitosa (2 Timóteo 3:16-17), e mesmo os detalhes aparentemente menores podem revelar verdades transformadoras sobre Deus e nossa relação com Ele. Podemos derivar lições valiosas sobre humildade, a soberania divina, a natureza da graça e a nossa responsabilidade pessoal.

Primeiramente, o uso da Saliva por Jesus em curas nos ensina sobre a humildade e a disposição de Deus em usar meios simples e até mesmo desprezíveis para realizar Seus propósitos grandiosos. Os crentes são chamados a não desprezar o que é humilde ou comum, mas a reconhecer que Deus opera através de tudo (1 Coríntios 1:27-29). Isso nos exorta a não buscar grandes espetáculos ou métodos humanos elaborados, mas a confiar na simplicidade da pregação do Evangelho e na obra do Espírito Santo, que muitas vezes age de maneiras discretas e não glamorosas.

A soberania de Deus na escolha dos meios de cura e salvação é outra lição prática. Jesus não estava preso a um único método; Ele curava com a palavra, com o toque, e, em algumas ocasiões, com a Saliva. Isso nos lembra que a nossa responsabilidade pessoal não é ditar como Deus deve agir, mas confiar em Sua sabedoria e poder. Nossa fé salvadora não se apoia em rituais ou elementos externos, mas exclusivamente em Cristo. Contudo, Deus frequentemente usa "meios de graça" como a Palavra, os sacramentos e a oração para edificar e sustentar a fé.

A relação entre a Saliva e a responsabilidade pessoal é sutil, mas presente. Os que foram curados por Jesus, embora não tivessem feito nada para merecer a cura, tiveram que responder à Sua iniciativa. O cego de nascença teve que ir lavar-se no tanque de Siloé (João 9:7). Isso ilustra que a graça de Deus não anula a responsabilidade humana, mas a ativa. Somos salvos pela graça mediante a fé (Efésios 2:8-9), e essa fé nos leva à obediência, não como um meio de salvação, mas como fruto dela (Tiago 2:17). A vida cristã é uma resposta ativa ao dom imerecido de Deus.

O uso da Saliva também molda nossa piedade ao nos lembrar da encarnação de Cristo e de Sua compaixão tangível. Jesus não era um Deus distante, mas um que se sujou com o pó da terra e se envolveu pessoalmente com a miséria humana. Isso nos encoraja a uma piedade prática, que não se retira do mundo, mas se envolve com as necessidades dos outros, buscando servir e ministrar de forma concreta, assim como Cristo fez (Filipenses 2:5-8). Nossa adoração e serviço devem refletir essa compaixão e engajamento.

Para a igreja contemporânea, as lições da Saliva são um lembrete para não subestimar o poder de Deus em operar através do ordinário. A igreja não precisa de invenções humanas espetaculares para ser eficaz, mas precisa da presença e do poder de Cristo. A pregação fiel da Palavra, a administração correta dos sacramentos e o amor genuíno pelos irmãos e pelo próximo são os "meios" que Deus escolheu para edificar Seu reino. Como Charles Spurgeon frequentemente ensinava, a simplicidade do Evangelho e a dependência do Espírito Santo são mais poderosas do que qualquer artifício humano.

As exortações pastorais baseadas neste tema incluem encorajar os crentes a:

  • Confiar na soberania de Deus: Reconhecer que Ele usa os meios que Lhe aprazem, muitas vezes de forma inesperada.
  • Cultivar a humildade: Não desprezar os "pequenos" ou os "comuns", mas ver o potencial de Deus neles.
  • Praticar a compaixão tangível: Seguir o exemplo de Jesus, que se envolveu fisicamente com os aflitos.
  • Valorizar os meios de graça ordenados: A Palavra e os sacramentos são os canais pelos quais Deus nos abençoa.
  • Rejeitar o magicismo e a superstição: Evitar qualquer crença de que elementos físicos possuem poder em si mesmos, desviando a glória de Cristo.

O equilíbrio entre doutrina e prática é essencial. A doutrina da Saliva, embora incomum, nos leva a contemplar a profundidade da encarnação de Cristo, a natureza da graça e o poder da nova criação. Na prática, isso nos chama a uma vida de fé que confia plenamente em Cristo, uma vida de obediência que responde à Sua graça e uma vida de serviço que reflete Sua compaixão. É um lembrete constante de que Deus é capaz de redimir e usar até mesmo os elementos mais básicos e, por vezes, desprezados da criação para manifestar Sua glória e cumprir Seus propósitos eternos.